O fim do ano se aproxima, e já estamos há cerca de nove meses com medidas restritivas no mundo todo. Mesmo aquelas pessoas que só estão usando máscaras quando obrigadas, ainda estão com restrições, pois vários lugares continuam fechados, e outros, com medidas de distanciamento. Ou seja: em maior ou menor grau, todos somos afetados pela presente pandemia.
A palavra “rotina” costuma ser usada de maneira simplista, negativa (“nosso relacionamento caiu na rotina”, “é um procedimento de rotina”, etc), mas a verdade é que o ser humano precisa de rotina para dar conta de todas as atividades que a vida moderna nos exige: trabalho, estudo, relações pessoais, descanso, exercício, tudo isso toma tempo e o dia continua tendo as mesmas 24 horas. Ter uma rotina faz com que automatizemos parte dessas obrigações, otimizando nosso tempo, liberando espaço para descanso e lazer, e assim permitir uma vida mais saudável.
Entre os diversos problemas gerados pela pandemia, está a quebra da nossa rotina: Quem saía no final de semana, não pode sair mais, quem fazia o happy hour com os colegas depois do trabalho não pode mais, quem ia ao cinema ou ao teatro, não pode mais. Quem ouvia música indo ao trabalho, talvez esteja de home-office e não tem mais um trajeto a fazer, portanto, não ouve mais música. Aquelas pessoas que estão empregadas em setores diretamente ligados à pandemia (trabalhadores do setor de saúde, por exemplo), podem ter mantido boa parte de sua rotina, mas com certeza estão sobrecarregados e trabalhando numa intensidade maior do que a de costume. Quem trabalhava em escritório, com suas tarefas a fazer, pelo menos podia conversar com os colegas, pegar um café ou uma água. À falta de interação com os colegas, some-se o malabarismo entre trabalho em casa, filhos pedindo atenção e vizinhos fazendo barulho, o que dificulta ainda mais a situação. Além disso, como já está em casa, e não se tem um marco do final do expediente, muitos estão trabalhando por muito mais tempo, reduzindo ainda mais o tempo de descanso. É essa quebra de rotina que tem trazido sintomas como aumento da irritabilidade, insônia, ansiedade, falta de disposição, enfim, um desconforto generalizado que por vezes se torna difícil de identificar qual o gatilho por trás de tudo isso.
A rotina é intrínseca ao ser humano, uma vez que temos o ciclo circadiano que dita as funções básicas de liberação de diversos hormônios em nosso corpo. O ritmo circadiano é ditado diretamente pela luz solar, mas também pelos moduladores de tempo (zeitbergs): o horário para levantar, o horário para tomar o café da manhã, o horário para começar a trabalhar, etc. E conforme a idade avança, dependemos cada vez mais desses moduladores de tempo, pois a incidência de luz solar vai se tornando ineficiente.
Outro fator de desconforto precipitado pelo momento histórico atual, é mostrar para algumas pessoas que o andamento de suas vidas estava configurado de uma maneira pouco saudável, pouco enriquecedora em termos de experiência de vida: a pessoa trabalhava muito, o popular “se afundava no trabalho”, passava o final de semana trabalhando mais, fazendo um curso, ou saindo para beber, de uma maneira onde simplesmente não havia tempo para viver, para desenvolver um interesse próprio. Ela tinha um quadro de sobrevivência: Um dia após o outro, segunda à sexta-feira e aí repete o processo. E agora, sendo forçados a ficar em casa (e eventualmente, porque perderam o emprego, infelizmente) muitos estão se dando conta disso e aí surgem os questionamentos existenciais: “Mas quem sou eu?”, “O que eu gosto de fazer?”, “Por que eu me mantenho nesse emprego?”, são todas questões que andam aparecendo bastante nos atendimentos ultimamente.
Ter um hobby, uma atividade que você faça unicamente por que gosta, pode ajudar bastante a passar por esse momento: além de ser uma fonte de alegria e entretenimento, muitos hobbies permitem que tenhamos uma imersão completa num mundo imaginário, oferecendo assim uma fuga momentânea da realidade em que vivemos. Dedicar um tempo a um hobby faz com que retornemos de modo renovado para nossas atividades e obrigações diárias. Pintura, colecionismo, restauração de antiguidades, artesanato, tudo isso pode ser feito em casa e tem efeitos maravilhosos sobre nosso grau de stress. Essas atividades promovem a higiene mental, atuam como uma espécie de “reset” em nosso cérebro, restabelecendo nossas energias para encararmos nossas obrigações e responsabilidades com mais leveza.
É importante reavaliar nossas atividades diárias e tentar recobrar pelo menos parte da nossa antiga rotina. Perceba se você está trabalhando mais horas do que antes, mesmo de home-office. Tente reduzir esse tempo para o que era antes. Use o tempo que sobrou para descansar. Por descanso entenda desde atividades de repouso (deitar-se, assistir um filme, seriado, ouvir música, etc) e também os hobbies da maneira como comentada anteriormente (onde você estará fazendo alguma coisa, mas é uma atividade prazerosa). Entre em contato com amigos e família, se desejar. Faça vídeochamadas. Se for casado ou casada, tente criar alguma atividade com o cônjuge, algo que possam fazer juntos, talvez resgatar um antigo interesse, ou então criar um novo. Temos que usar as ferramentas que a tecnologia atual nos oferece para tentar mitigar pelo menos parte dos danos gerados por esse problema. A calamidade vai passar, mas como ficará a sua saúde mental?
Texto escrito por: Douglas F. H. Oliveira, psicólogo OrienteMe.
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